Calma | Sextante
Livro

Calma

Este livro pertence à coleção THE SCHOOL OF LIFE

The School of Life

Este é um livro que examina as maiores causas do estresse, oferecendo uma sucessão de argumentos convincentes e às vezes ironicamente cômicos para nos defender da raiva e do medo.

Calma faz parte da Coleção The School of Life, que traz livros sobre as questões mais importantes da vida emocional com o objetivo de entreter, educar, confortar e transformar.

 

Poucas habilidades são tão importantes e ao mesmo tempo tão negligenciadas quanto a capacidade de manter a calma. Quase sempre, nossas piores decisões são tomadas em momentos em que perdemos a calma e nos deixamos dominar pela ansiedade e a agitação.

Felizmente, nosso poder de permanecer calmos pode ser exercitado e aperfeiçoado. Não precisamos aceitar o estado atual das coisas: nossas reações diante dos desafios do dia a dia podem ser radicalmente transformadas.

E para nos educarmos na arte de manter a calma, não precisamos de técnicas respiratórias nem de chás especiais – mas apenas do pensamento.

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Ficha técnica
Lançamento 26/03/2018
Título original CALM
Tradução BEATRIZ MEDINA
Formato 16 x 19 cm
Número de páginas 144
Peso 500 g
Acabamento CAPA DURA
ISBN 978-85-431-0425-6
EAN 9788543104256
Preço R$ 59,90
Ficha técnica e-book
eISBN 9788543105855
Preço R$ 34,99
Ficha técnica audiolivro
ISBN 9788543107141
Duração 03h 46min
Locutor Sidney Ferreira
Lançamento 26/03/2018
Título original CALM
Tradução BEATRIZ MEDINA
Formato 16 x 19 cm
Número de páginas 144
Peso 500 g
Acabamento CAPA DURA
ISBN 978-85-431-0425-6
EAN 9788543104256
Preço R$ 59,90

E-book

eISBN 9788543105855
Preço R$ 34,99

Audiolivro

ISBN 9788543107141
Duração 03h 46min
Locutor Sidney Ferreira
Preço US$ 7,99

Leia um trecho do livro

Introdução

A calma tem um encanto profundo e natural. Quase todo mundo quer ser mais paciente, sereno, relaxado e capaz de reagir com discreto bom humor aos contratempos da vida e ao que nos causa irritação.

Mas costumamos ter apenas uma vaga ideia do que fazer para ter mais calma. Enquanto isso, a ansiedade está dia e noite à nossa espreita, tamborilando quase o tempo todo em segundo plano. Ela pode estar conosco agora mesmo.

Extraída das tradições do budismo, uma resposta à agitação se tornou muito popular no Ocidente nos últimos anos: esvaziar a mente com a prática da meditação. A ideia é sentar-se em silêncio, talvez numa postura especial, e se esforçar, através de vários exercícios, para esvaziar o conteúdo da mente. O objetivo é repelir ou afastar para a periferia os objetos perturbadores e pouco nítidos da consciência, deixando um espaço central vazio, sereno e minuciosamente consciente de si mesmo.

Implicitamente, esse ponto de vista propõe que as coisas que nos inquietam são, em grande parte, insignificantes e aleatórias, portanto, a melhor solução seria silenciá-las. Nossas ansiedades não teriam nada de especial a nos dizer. Mas há outra abordagem que interpreta nossas preocupações como sinais neuroticamente distorcidos porém fundamentais do que talvez esteja errado na nossa vida. Segundo essa visão, a questão não é tentar negar ou neutralizar a ansiedade, mas aprender a interpretá-la, decodificando algumas informações valiosas que nossos momentos de pânico estão tentando nos transmitir de uma maneira reconhecidamente infeliz.

Toda situação em que perdemos a calma pode ser analisada e nos revelar algo que deveríamos saber sobre nós mesmos. Cada preocupação, frustração, episódio de impaciência ou ataque de irritação tem algo importante a nos dizer – desde que estejamos dispostos a decodificá-lo. Em vez de se esforçar para esvaziar a mente, uma possibilidade para cultivar a calma seria examinar de forma mais lenta e cuidadosa nossas experiências de agitação e esclarecer as preocupações que estão por trás delas.

Esse é o caminho deste livro. Nele, vamos investigar sistematicamente várias das questões responsáveis por nossos episódios de agitação, fúria e raiva, desvendando as causas e o conteúdo de nossas perturbações para alcançar um lugar de calma a partir da compreensão paciente e nobre dos curiosos bastidores da nossa mente.

Capítulo Um:

Relacionamentos

I. Expectativas românticas

A fantasia central por trás de toda inquietação e angústia dos relacionamentos é encontrar alguém com quem possamos ser felizes. Isso soa quase risível, dado o que costuma acontecer.

Sonhamos com alguém que nos entenda, com quem consigamos dividir nossos anseios e segredos, com quem possamos ser frágeis, brincalhões, relaxados – ser nós mesmos.

Então começa o show de horrores. Nós o conhecemos indiretamente quando ouvimos o casal gritando no apartamento ao lado enquanto escovamos os dentes ou quando vemos esse mesmo casal de cara feia no restaurante. E algumas vezes – é claro – a crise se abate sobre nossas próprias relações.

Em nenhuma outra circunstância tendemos a nos comportar tão mal quanto em nossos relacionamentos. Neles, nos tornamos pessoas que nossos amigos mal reconheceriam. Desco­brimos uma capacidade assustadora de sentir angústia e raiva, nos tornamos frios ou furiosos, saímos batendo portas. Gritamos e dizemos coisas que machucam. Depositamos grandes esperanças nos relacionamentos – mas, na prática, parece que essas relações foram projetadas especialmente para aumentar nossa inquietação.

Uma característica fundamental do funcionamento da mente é o fato de o tempo todo criarmos expectativas sobre como as coisas vão acontecer. Quase sem notar nossas tendências, construímos um roteiro de como o futuro deve se desenrolar. Essas expectativas não têm nada de inocentes e se tornam o parâmetro segundo o qual julgamos tudo que acontece. Não achamos algo terrível ou fantástico em si, mas em relação às noções de normalidade que secretamente construímos em algum lugar da consciência. Assim, acabamos cometendo uma enorme injustiça com as reais condições da nossa vida.

Somos levados a ataques de fúria em situações que contrariam o que esperávamos. Não gritamos sempre que algo dá errado; apenas quando dá errado sem que esperássemos. Seria ótimo se fizesse sol no feriadão, mas, ao longo dos anos, aprendemos que o clima pode surpreender. Assim, não ficamos furiosos ao perceber que está garoando. Quando já estamos de certa forma preparados para alguma possibilidade deprimente, não corremos o risco de perder a cabeça. Podemos não ficar felizes, mas também não ficamos espumando de raiva. No entanto, quando não conseguimos encontrar as chaves do carro (que ficam sempre na gavetinha perto da porta), a reação pode ser muito diferente. Aqui, uma expectativa foi violada. Alguém deve ter tirado as malditas chaves do lugar de propósito. Íamos chegar na hora, agora vamos nos atrasar. É uma catástrofe! Você fica morto de raiva porque, em algum lugar da sua mente, tem uma fé perigosa num mundo em que as chaves do carro simplesmente nunca somem. Cada uma das nossas esperanças – formadas inocente e misteriosamente – se abre para uma vasta possibilidade de sofrimento.

Nos relacionamentos românticos temos o hábito de criar as expectativas mais altas. O senso comum está repleto de ideias fantasiosas sobre o que décadas de vida conjugal nos reservam. Não desconhecemos os desafios do amor e, por todos os lados, podemos observar pessoas com dificuldades. Todo mundo fala sobre taxa de divórcios e brigas domésticas. Ainda assim, alguma parte da nossa mente continua impenetrável aos pormenores melancólicos. Apesar da imensa quantidade de evidências, nos agarramos a noções românticas que pouco se assemelham às histórias de amor que se desenrolam ao nosso redor.

Confiamos em nossa destemida boa sorte. Apesar de todos os obstáculos, acreditamos que existe alguém por aí – a lendária “pessoa certa” – com quem tudo dará certo, com quem poderemos desnudar a alma e terminar nossos dias em profunda satisfação.

Não estamos sonhando. Só estamos relembrando. A origem de algumas das nossas esperanças de amor não está em nenhuma experiência da vida adulta. Está numa fonte um pouquinho mais curiosa: a primeira infância. Nosso conceito do que torna um casal feliz é extremamente influenciado pelo tipo de relação que um bebê tem com a mãe ou o pai, repleta de carinho, segurança e compreensão tácita. Os psicanalistas sugerem que todos nós conhecemos o estado de amor no útero e na primeira infância, quando, nos melhores momentos, a bondosa pessoa que cuidava de nós interagiu conosco de uma maneira semelhante à que o parceiro adulto pode fazer. Essa pessoa atendia às nossas necessidades, até as que tínhamos dificuldade de verbalizar, nos oferecia uma sensação de segurança e nos aconchegava para dormir. Projetamos essa lembrança no futuro; criamos uma expectativa sobre o que pode ocorrer com base no que já aconteceu – só que de acordo com um modelo que agora é inviável.

Sempre tivemos sonhos de um amor feliz. Mas apenas em nossa história recente passamos a imaginar que eles pudessem se realizar no seio do casamento. Um aristocrata francês do século XVIII, por exemplo, partiria do princípio de que o casamento era algo necessário para a reprodução, a manutenção da propriedade e a formação de alianças sociais. Não havia qualquer expectativa de que, além de tudo isso, também pudesse levar à felicidade com uma esposa. Isso ficava reservado para os casos amorosos – esses, sim, alvos reais de ternura e esperanças emocionais complexas. O lado prático de um relacionamento e o anseio romântico por proximidade e comunhão eram mantidos em planos separados. Só muito recentemente o idealismo emocional do caso de amor passou a ser considerado possível – e mesmo necessário – dentro do casamento. Sem dúvida, hoje esperamos que nossas uniões incluam grandes dimensões pragmáticas, envolvendo juros das parcelas da casa própria e cadeirinhas automotivas para crianças. Mas, ao mesmo tempo, esperamos que os relacionamentos atendam a todos os nossos anseios de compreensão profunda e afeto.

Nossas expectativas tornam tudo muito difícil.

As expectativas são mais ou menos assim: o bom ou a boa amante nos compreende muito bem, portanto é desnecessário nos alongarmos em explicações sobre nosso estado de espírito. No fim de um dia estressante de trabalho, não haverá necessidade de especificar que seria legal passar algum tempo na própria companhia; nosso ser amado simplesmente saberá e, num passe de mágica, irá para outro cômodo. Ele terá uma capacidade aguçada de perceber o que acontece dentro de nós, mesmo que não tenhamos usado palavras para informá-lo. Ficará sempre do nosso lado; verá as coisas do nosso ponto de vista. Não insistirá que façamos certas coisas para ele. Suas necessidades serão mínimas; ele não terá amigos chatos e sua família oferecerá apoio sem atrapalhar.

O mais estranho é que, apesar de todos os relacionamentos insatisfatórios que possamos ter vivido, nos recusamos a abandonar essas esperanças. A experiência parece ser incapaz de abalar as nossas expectativas. Sempre que fracassamos, insistimos em atribuir nosso insucesso à pessoa com quem estamos. Localizamos o problema: tudo era culpa dos estranhos hábitos do ou da ex e de sua recusa em crescer da forma como lhe mandamos fazer. Sabemos ser punitivos com nossos ex, mas nos recusamos a culpar o próprio amor. Colocamos a responsabilidade em tudo, menos nas nossas ideias sobre o amor. E, antes de nos darmos conta, já estamos outra vez prontos a oferecer nossas elevadas e problemáticas expectativas a um novo parceiro.

Quando enfrentamos dificuldades nos relacionamentos, a tendência nunca é culpar nossas ideias sobre o amor. Em vez disso, localizamos o problema e nos concentramos nos defeitos específicos do parceiro que contrariaram nossas expectativas românticas. Viramos especialistas em listar o que havia de errado no outro: como nos decepcionou, não soube nos entender e foi egoísta. Porém preservamos a crença de que alguém, em algum lugar, estará à altura das esperanças de amor a que nos agarramos. Talvez seja aquela pessoa tão encantadora que conhecemos na estação de trem com quem trocamos algumas palavras sobre as máquinas de venda automática. Talvez ela seja a resposta. Deve haver um jeito melhor do que esse.

Raramente somos mais desprezíveis do que com as pessoas com quem concordamos em dividir a vida. No trabalho e entre amigos, somos sempre gentis e bem-educados. Mas, quando estamos perto da pessoa amada, aquela entre toda a população do planeta com quem assumimos o maior compromisso – a que está em nosso testamento e tem direito a todas as nossas posses –, mostramos um mau humor do qual os outros nem imaginam que somos capazes. Não somos especialmente malvados nem estranhos; são as nossas expectativas que tornam tão complicado conviver com a gente. Podemos nos dar ao luxo de ser amistosos com os meramente conhecidos por uma razão muito simples: porque não ligamos tanto para eles.

A pessoa que amamos tem um poder inigualável de nos levar à fúria porque não há ninguém de quem esperemos mais. Nossos maiores arrependimentos – xingar o outro no carro, gritar tarde da noite no quarto do hotel, zombar de seus modos numa festa – são os subprodutos horripilantes de algo que, por fora, parece muito inocente: as expectativas, o elemento mais inflamável e perigoso de qualquer relacionamento.

Um bom modo de nos acalmar é adotar uma filosofia que, a princípio, parece nociva ao amor: o pessimismo. Estamos acostumados a ver essa qualidade com maus olhos, pois ela cheira a resignação e cinismo. Parece ser inimiga da afeição. Mas, no amor, são exatamente as expectativas que põem em risco tudo o que mais desejamos.

A melhor maneira de entrar num relacionamento seria ter em mente que sermos constantemente mal compreendidos é normal. Isso não deveria ser razão para rancores nem surpresas. Nossa mente é infinitamente sutil e cavernosa; não admira que os outros nunca consigam entender seu conteúdo. Idealmente, ajustaríamos nossas expectativas de acordo com esse dado desde o princípio. Saberíamos que o mais provável é continuarmos mais ou menos indecifráveis até para quem tem as intenções mais ternas a nosso respeito. Isso não significa que ficaríamos sempre tristes. É claro que, principalmente nos primeiros dias, a relação iria mesmo muito bem. A pessoa amada diria coisas totalmente alinhadas com nossas crenças mais íntimas. Ela mostraria uma compreensão de nosso eu mais profundo que iria muito além do que até nós mesmos alcançamos. Mas saberíamos que isso não seria algo frequente. Saberíamos que, com o passar do tempo, a norma seriam as pequenas incompreensões. Não nos zangaríamos nem nos surpreenderíamos. Desde o começo, nossas expectativas teriam sido corretamente ajustadas. Não ficaríamos amargurados nem na defensiva por causa disso; apenas gratos por termos sabido o que esperar.

O melhor é pressupor que, em qualquer relacionamento, haverá áreas significativas de discordância – que podem muito bem se mostrar sem solução. Não devemos gostar particularmente desse fato. Nem é que estejamos ansiosos para ficar com alguém de quem sempre discordamos. Apenas vamos supor que será improvável encontrar alguém que esteja em sintonia conosco em todas as questões importantes. A ideia é que um bom relacionamento envolva forte concordância no que diz respeito às questões principais e que, numa série de outras áreas, haja atitudes e ideias diametralmente divergentes. Essa divergência não deve parecer o fim de tudo ou uma terrível concessão. Será tão normal quanto trabalhar no escritório ao lado de alguém que discorda de você sobre o melhor lugar para passar as férias ou que tenha um gosto totalmente diferente do seu. Um bom relacionamento não significa concordância absoluta. Além disso, com frequência, o ser amado estará envolvido com as próprias preocupações – que, na verdade, não terão nada a ver conosco.

Num mundo mais sensato do que o nosso, sempre nos lembraríamos das várias razões pelas quais ninguém é capaz de cumprir as expectativas que passaram a estar vinculadas aos relacionamentos românticos.

O ser amado não é a mesma pessoa que nós

Uma das características mais espantosas dos bebês é que, durante um tempo surpreendente, eles não têm noção de que a mãe é outra pessoa. Ela parece ser um mero apêndice de seu próprio ser, como um membro adicional que eles quase conseguem controlar. Parte dessa ilusão nos acompanha nos relacionamentos da vida adulta. Neles, também podemos demorar a reconhecer plenamente que o ser amado não está ligado à nossa psique por um cordão umbilical; que ele não é uma extensão de nós, mas um ser independente com pontos de vista bem diferentes e, muitas vezes, dolorosamente contrários aos nossos. Ele pode estar num estado de espírito diferente do nosso, preparando-se para dormir enquanto tudo que queremos é sair para dançar, ter uma opinião contrária sobre um filme ou não simpatizar com alguma ideia que nos parece fundamental.

O início não indica o que virá pela frente

O sentimento de estarmos “apaixonados” tende a começar com a percepção de que nós e a pessoa amada temos muito em comum. Pode ser em assuntos importantes: orientação política, atitude diante da educação, opinião sobre o papel das mulheres na sociedade. Ou pode ser em questões muito menores, mas mesmo assim muito significativas: ela também gosta de longos passeios pelo campo, de música barroca ou da obra de um poeta bósnio obscuro. Essas descobertas criam pequenas explosões de êxtase no coração dos amantes, pois são sinais redentores do fim da solidão.

A fase romântica do amor gira em torno do reconhecimento do que duas pessoas têm em comum, mas a ideia de que seja isso o verdadeiro amor é o arauto de um fim conturbado para qualquer união. Quando duas pessoas permanecem juntas, é inevitável que encontrem áreas de séria divergência. Longe de ser a prova de que o amor está fracassando, o mapeamento das zonas de discordância é um sinal de que o amor prosperou e os dois estão passando do terreno da fantasia instável para o da realidade de bases nobres e sólidas.

A infância de ninguém foi normal

Por mais bem-intencionados que os pais tenham sido, ninguém teve uma infância “normal” – no sentido de um conjunto de experiências que deixe a pessoa completamente preparada, pronta a reagir de forma apropriada às dificuldades, capaz de superar desafios, disposta a ter um ponto de vista confiante sobre os acontecimentos e capaz de amar sem engenhosamente sabotar a relação com a qual afirma estar comprometida. É claro que essa criatura é uma possibilidade teórica, mas é muito improvável que cruze nosso caminho.

Em vez disso, nos deparamos com pessoas deformadas por dinâmicas que nem elas entendem direito e sobre as quais não podem nos avisar a tempo. Talvez tenham a tendência a ficar furiosas sem razão aparente; talvez nossa família evoque os traumas delas, tornando-as incapazes de demonstrar um mínimo de educação diante de nossos parentes; talvez um pai severo as tenha deixado para sempre desconfiadas de toda autoridade ou uma mãe exageradamente permissiva as tenha tornado resistentes demais a qualquer tipo de crítica. Pode ser que sejam incapazes de ficar um tempo sozinhas ou tenham a dolorosa tendência de ir ler no quarto ao menor sinal de tensão.

Corremos o risco de reagir muito mal à descoberta dessas distorções e interpretá-las como prova de que tivemos um azar espantoso. Por algum tempo, pareceu que tínhamos encon­trado uma pessoa normal, mas, na verdade, acabamos descobrindo que estamos com uma aberração (ou pior). Começamos então a procurar alternativas. Tudo que conseguimos ver, com precisão maníaca, são as falhas do parceiro. Não é que necessariamente estejamos errados a respeito delas, mas estamos completamente enganados ao imaginar que elas não são universais.

Cada um é doido de um jeito, mas a loucura é generalizada. A passagem do animal humano à maturidade é um processo tenso demais para se desenrolar sem incidentes graves; portanto, distorções de caráter são uma certeza, não um risco. Não deveríamos nos perguntar se a pessoa por quem estamos interessados é problemática ou não. Na verdade, precisamos apenas considerar até que ponto ela é.

Em várias áreas da cultura e da vida é possível identificar duas atitudes principais – e contrastantes – que podem ser resumidas sob os rótulos de “romântica” e “clássica”. A princípio, essa distinção foi usada em relação às artes, mas ela também é facilmente aplicável ao modo como pensamos e nos sentimos nos relacionamentos. Muitas das nossas atuais expectativas de como os relacionamentos devem ser foram profundamente influenciadas pelas ideias românticas. Há vários pontos de conflito entre o classicismo e o romantismo, como:

Autenticidade versus boas maneiras

Do final do século XVIII em diante, os artistas e pensadores românticos ficaram cada vez mais entusiasmados com a ideia de falar francamente e com liberdade sobre todos os assuntos. Eles não gostavam da noção de uma convenção social que restringisse o que podiam dizer ou não. Achavam que se conter era ser meio falso. Que fingir sentimentos ou dizer algo só para ser gentil com alguém eram a marca dos hipócritas. Traduzido para os relacionamentos, esse ponto de vista alimentou a expectativa de que temos que contar tudo ao outro, de que, se não dizemos alguma coisa, estamos traindo o amor.

Por outro lado, o indivíduo clássico admira as boas maneiras. Ele acha importante suavizar a situação mesmo quando não pode haver uma concordância total, acrescentando uma ocasional pincelada de afago no ego do outro. Não é que ele tenha medo de aborrecer os outros; apenas sente que essa jogada não costuma ser construtiva. Esse tipo de pessoa pensa que, na verdade, só conseguimos lidar com uma quantidade limitada de notícias negativas ou confrontadoras e que, para sobreviver, um relacionamento talvez precise aceitar a existência de algumas áreas proibidas, zonas de privacidade e resignação.

Na visão clássica, uma relação marcada pelas boas maneiras não é uma concessão dolorosa. Não é um retrocesso em relação à dificílima tarefa de abertura total. Em vez disso, é um ideal distinto por si só. O relacionamento deve ser um lugar onde cada um tem consciência da fragilidade do parceiro em certas questões – e deliberadamente tem o cuidado de tratá-lo com delicadeza. Essa é uma realização admirada e uma verdadeira expressão do amor.

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The School of Life

Sobre o autor

The School of Life

A The School of Life se dedica a desenvolver a inteligência emocional através da cultura, com base na crença de que nossos problemas mais persistentes são criados pela falta de autocompreensão, compaixão e comunicação.A organização possui dez sedes ao redor do mundo, em locais como Londres, Amsterdã, Seul, Melbourne e São Paulo, onde produz filmes, oferece cursos e cria uma variedade de programas e serviços voltados para o bem-estar.Com o objetivo de entreter, educar, confortar e transformar, a The School of Life produz livros sobre as questões mais importantes da vida emocional contemporânea.

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