Choro, birra, mentiras e punições: seis dicas para entender o comportamento das crianças | Sextante
Choro, birra, mentiras e punições: seis dicas para entender o comportamento das crianças
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Choro, birra, mentiras e punições: seis dicas para entender o comportamento das crianças

Educar é uma arte de amor, compreensão e autoconhecimento. O tempo dos gritos e tapas caducou para uma nova geração de mães e pais. Ainda bem. Todos já foram crianças um dia, mas essa vivência não tira do universo infantil seu mistério inerente. Os filhos se mantém como enigmas: por que choram, brigam, mentem e […]

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Educar é uma arte de amor, compreensão e autoconhecimento. O tempo dos gritos e tapas caducou para uma nova geração de mães e pais. Ainda bem. Todos já foram crianças um dia, mas essa vivência não tira do universo infantil seu mistério inerente. Os filhos se mantém como enigmas: por que choram, brigam, mentem e esperneiam? Na ânsia de prepará-los para o mundo, alguns se perdem em impulsos e mal-entendidos.

A psicoterapeuta Isabelle Filliozat parte dessas questões para decifrar o comportamento infantil em dois livros. Já tentei de tudo! (sobre crianças de 1 a 5 anos) e Meu filho me enlouquece! (com foco em crianças de 6  a 11 anos) não trazem receitas prontas, mas apontamentos, dicas e informações para ajudar pais a aproveitarem melhor o tempo com os filhos. Faz isso sempre levando em conta a perspectiva da criança e reforçando a importância do carinho e da conversa na troca entre pais e filhos.

Abaixo, você confere três dicas de cada um dos títulos.

Choro na madrugada: a criança acorda à noite!

Mãe e pais sabem: a hora de dormir pode ser sinônimo de pesadelo antes mesmo de a criança cair no sono – e se cair, né? Canções de ninar, carinhos e historinhas costumam embalar os pequenos rumo ao mundo dos sonhos, mas ele pode se esvair em pouquíssimo tempo. É então que o buá-buá toma conta da casa, rasgando a noite e a tranquilidade alcançada. Pais se estressam e se preocupam, mas muitos não entendem o motivo do choro dos filhos. Não poderia ser mais óbvio: “A criança chora para que não a deixemos sozinha à noite”, explica Filliozat.

Acordar duas ou três vezes por noite é normal ao fim do primeiro ano de vida. Isso porque a criança ainda não sabe lidar com a ansiedade – não só psicológica, mas fisiológica também – oriunda desse momento solitário que se repete a cada noite. O choro é a única maneira de ela comunicar a angústia. Como num passe de mágica, o carinho dos pais faz com que tudo volte ao normal. A autora destaca o cuidado para não estimular a criança excessivamente à noite. O ideal é não falar muito. “Mais vale intervir no primeiro sinal de que a criança despertou, antes que ela acorde por completo, colocando delicadamente a sua mão sobre ela, sem acariciar. Assim, ela volta a dormir sem passar pela fase do choro. Sem estímulo, apenas contato”, esclarece.

A fase do não: a criança se opõe a (quase) tudo

Não. Não!!! Nãaaaaaao. De quantas maneiras se pode dizer não? Aqui, falamos daquele típico “não” dito por crianças, numa fase mais comum entre 1 ano e meio e 2 anos. É uma época complicada, porque a criança já tem consciência que é um indivíduo e deseja fazer valer suas vontades. Nesse momento, ocorre uma tentativa de separação dos pais, como se ela insistisse em sublinhar: “Eu não sou você”. Desse desejo de crescimento, surgem inúmeras formas de se opor. A questão é substancialmente mais delicada, como salienta Filliozat.

“A oposição só se instala quando os pais recusam a diferenciação. A criança deve então proteger a sua tão nova e ainda frágil identidade. Ela não quer permanecer o bebê (o objeto) da mamãe, ela quer crescer (tornar-se sujeito). A verdadeira necessidade dessa fase não é a de se opor, mas a de se diferenciar”. Sim, papais, podem se acalmar: os filhos amam você, só estão em busca da própria verdade. É importante que se dê espaço para que a criança pense e reflita. Para não sair esbravejando ordens, a autora dá algumas dicas: criar rotinas; fazer perguntas e instigar a reflexão; colocar a criança em posição de decidir, mesmo que seja sobre algo pequeno. “Oferecer escolhas permite também que a criança se sinta responsável pela decisão e diga EU”.

Punições resolvem?

Filliozat é taxativa: “Se as punições educassem, há séculos a espécie humana não cometeria mais crimes”. Então, por que mães e pais ainda insistem nesse modelo para impor limites aos filhos? Para a psicoterapeuta, castigos são eficazes a curto prazo e dão a sensação àqueles que punem de retomar o controle da situação. Esses dois fatores explicam por que são tão utilizados. Mas a lista de desvantagens é enorme e pode ser sintetizada por este pensamento: as punições se concentram nos sintomas e não nas causas dos problemas. E isso é um grande problema.

“Quando não há elo entre o comportamento e a punição, a criança não aprende nada com relação às razões de tal ação ser inapropriada. Elas impedem o surgimento do sentimento saudável de culpa, desviando a atenção da criança para sentimentos negativos em relação aos pais: injustiça, raiva, medo etc”, sustenta a autora. A criança não reflete sobre o que faz e cristaliza a imagem dos pais a partir do estresse. A punição reforça o descontrole e a impotência dos pais, e a consciência disso torna a criança insegura e propensa a comportamentos desviantes.

A criança se fecha e recusa o contato

Então, a criança se isola: a mãe ou pai chega do trabalho e o filho vai imediatamente para o quarto. Há quem cogite desamor, mas a criança apenas pode estar respondendo ao vazio da ausência dos pais. A criança sente que é um fardo, que incomoda, e enxerga nesse refúgio (a ida ao quarto, normalmente) uma maneira de não intensificar esse sentimento persistente.

Muitos pais tentam justificar o distanciamento do filho – dizem: “ele está precisando ficar na dele” -, mas às vezes não percebem que estão diante dos próprios medos. São adultos que sofreram rejeição na infância e projetam o próprio pai ou mãe no filho. “Dedicar um tempo à criança irá restaurar a conexão. Chamego, brincadeiras, risos, massagem… A recusa e as lágrimas talvez (provavelmente) precedem a reconexão. Tem medo de se decepcionar, de sofrer de novo”.  Pense nisso e busque a consciência de quem você é e do que você passou. Procure seu filho de coração aberto.

A criança mente

Como se sabe, a mentira tem pernas curtas. Mas no mundo infantil – diante de inseguranças e fantasias – essas perninhas pisam num terreno novo e frágil. Não vale encarar a mentira com a perspectiva do mundo adulto. Filliozat explica que, antes dos 7 anos, a criança quer agradar aos pais. As respostas escapolem da boca, vão do “não” ao “sim”, com esse objetivo. Então, se a mãe pergunta furiosa “Foi você quem fez isso?”, a tendência é que a criança responda não,  mesmo que ela tenha feito. Isso acontece porque ela entende que essa é a resposta esperada. A noção de responsabilidade não é assimilada por crianças menores de 7 anos, que ainda experimentam uma vida cujos limites entre o imaginário e o real são incertos.

A partir dos 7 se impõe na criança o desejo de estar sempre certa. Há uma preocupação com a própria imagem, o que a leva a acusar os outros pelos próprios erros. O medo do castigo também pode fazê-la mentir. “O melhor jeito de evitar que ela minta é não lhe causar medo ou vergonha e ser sempre uma pessoa de confiança, com a qual ela possa se abrir”, assegura a psicoterapeuta. Não se esqueça que as crianças enxergam os pais como modelos. Portanto, tome o cuidado de não mentir para ela.

A criança sempre faz o que é proibido

Muitas vezes, transgredir é progredir. Fazer o que é proibido – ou seja, contrariar as determinações dos pais – é inerente ao comportamento infantil. No livro, o tópico é dedicado aos pequenos na faixa dos 8 anos. Nessa fase, embora reflita minimamente sobre seu comportamento, a criança age de acordo com o que chama a atenção dela. É preciso levar em conta que muitas proibições são expressas como ordens. “Os exames de imagem funcional do cérebro mostram que as ordens não mobilizam o cérebro frontal. A criança, portanto, não pensa na situação”, afirma Filliozat.

Além disso, os pais não devem se esquecer da busca da criança pela identidade própria, um “eu” com vontades e desejos. “Rebelar-se contra a autoridade, experimentar por si própria, sentir-se livre não são atribuições de crianças mal-educadas, mas de qualquer ser humano”, ressalta. No lugar de proibições, a autora sugere regras e permissões, pois elas sinalizam o comportamento desejado.

Este post foi escrito por:

Filipe Isensee

Filipe é jornalista, especialista em jornalismo cultural e mestrando do curso de Cinema e Audiovisual da UFF. Nasceu em Salvador, foi criado em Belo Horizonte e há oito anos mora no Rio de Janeiro, onde passou pelas redações dos jornais Extra e O Globo. Gosta de escrever: roteiros, dramaturgias, outras prosas e alguns poucos versos estão em seu radar.

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